Crítica | De Primeira


★★★★☆
4/5

Curiosamente, 2021 vem sendo um ano de incríveis destaques na cena nacional. Dentro desse contexto, a pós-MPB, ou a Nova MPB, — como as pessoas costumam enquadrar todo esse conjunto musical contemporâneo que faz referência aos clássicos da Música Popular Brasileira se dedilhou a partir de artistas como Duda Beat, Pabllo Vittar, Giovani Cidreira e outros exemplos de destaque. E não muito distante desses, Marina Sena, ex-integrante do Rosa Neon, é mais um nome a compor esse movimento em constante expansão, principalmente no que diz respeito a uma abordagem pop de ritmos regionais, sendo esse o elemento essencial usado pela artista em seu álbum de estreia, De Primeira. Um projeto acessível e equilibrado em ótimas bases, onde Marina sem nenhum esforço consegue permear entre campos musicais diferentes, tudo isso sendo criativa o tempo todo e imprimindo a sua identidade em cada camada, verso ou instrumental presente no disco.

Traçando uma linha narrativa envolta de capricho, é impossível não se identificar com grande parte das composições que abrem espaço para interpretações ao longo do álbum. Ciente disso, Marina obviamente não se limita às meras referências do amor, ela vai fundo, explora até a última crosta da desilusão e dos sentimentos provocados por ele, como em “Temporal”, onde a artista canta sobre um relacionamento conturbado fazendo analogias bem criativas para expressar a dor e curar suas feridas: “Disperso, na ponta da língua / Incerto, eu não vejo saída / Me entrego, ou deixa a ferida aberta / Eu não posso deixar mais / Se parece com você / Só se for o temporal / Mexe tudo que te ver / Me deixa sem abrigo”.

Outro exemplo da habilidade notável desenvolvida pela cantora em fisgar a emoção do ouvinte está na já conhecida “Me Toca”, faixa de abertura lançada em janeiro deste ano e que consegue espelhar perfeitamente a direção segura acerca da sonoridade e composição lírica que podem ser encontradas no restante do álbum. Na sequência, “Pelejei” e “Por Supuesto” são capazes de conquistar qualquer um a primeira-vista, justamente pelo sentido acessível em que as canções se desdobram enquanto vocais abafados e fragmentos distorcidos na produção abrem espaço para “Cabelo”, uma das composições mais interessantes — seja pelo sentido ininterrupto de versos que parecem não ter fim ou pelas pequenas referências das quais remontam uma atmosfera deliciosa de verão.

“Voltei Pra Mim”, o segundo single surge com uma proposta diferente do primeiro, dessa vez, a artista busca apresentar melhor a sua voz, e assim é feito. A música começa e termina de maneira majestosa, indo de versos contidos no pré-refrão até uma explosão de ritmos e vocais que parecem ter sido feitos apenas para Marina, que por sua vez, se desprende da narrativa encontrada no início e assume uma reviravolta calorosa, se libertando por completo e tomando as rédeas da sua jornada cada vez mais intensa. Resultado visto em “Temporal” e “Tamborim”, sendo essa última um exemplo da riqueza proporcionada pela ótima abordagem de sons brasileiros, nesse caso, o samba e precisamente o cavaquinho chamam a atenção.

Nos últimos instantes, “Amiúde” com batidas mais aceleradas e “Seu Olhar”, faixa tomada por um reggae cheio de identidade acabam antecedendo “Santo”, canção que encerra o álbum de forma tão satisfatória quanto começou. E sobre começos, De Primeira se revela uma das melhores estreias do ano, principalmente pelo fato de que Marina Sena parece ter tomado para si a frente do pop nacional nesses últimos dias, nenhum outro artista conseguiu o feito de ter agradado todos os públicos como ela nesse lançamento. Isso por si só é um fato instigante sobre como o futuro dela na música pode ser tão brilhante quanto podemos imaginar. Mas por hora, não há nada mais importante para se observar do que a genialidade e a persuasão dos caminhos percorridos por Marina Sena em De Primeira: mais uma conquista extremamente importante para a música brasileira em 2021.

Selo: Alá Comunicação e Cultura
Formato: LP
Gênero: Pop / Pós-MPB
Matheus José

Graduando em Letras, 23 anos. No Aquele Tuim, faço parte das curadorias de Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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