Crítica | Unreal Unearth


★★★☆☆
3/5

Você provavelmente conhece o megahit "Take Me To Church", uma música de pop soul que colocou o cantor Hozier na estrada para o estrelato. Neste ano, quase uma década após seu maior sucesso, o artista retorna com seu terceiro álbum de estúdio e uma proposta muito mais ousada comparada ao resto de seu catálogo.

Tal proposta tem um estelar começo baseado em um filósofo fictício de um livro irlandês de 1967 — que acredita que a Terra tem formato de salsicha — assim, servindo como base para a história de crescimento pessoal e amoroso do eu lírico contada durante as 16 faixas. Não obstante em abordar um tema tão complicado quanto esse, Hozier decidiu compor paralelos aos 9 círculos do Inferno de Dante e a alguns mitos da mitologia grega. Pode parecer ilógico tentar combinar tudo isso de uma forma que o ouvinte médio consiga interpretar corretamente ao menos alguma nuância, mas Hozier prova a todos que ele é capaz de executar essa proeza, e ainda o faz com muita graça e esplendor.

A maioria das músicas apresentam palavras escolhidas a dedo, cada uma construindo um significado que adiciona pelo menos uma camada a mais ao conceito base já surpreendentemente labiríntico. Assim, a jornada de dissecar cada pequeno elemento contextualmente rico desse projeto pode levar horas — tempo esse consideravelmente menor se você utilizar o Genius, mas é mais divertido se aventurar só, desbravando os conceitos que rodeiam a obra.

Ademais, a capacidade vocal sem igual de Hozier une muito bem melodias pop e acessíveis a suas extravagâncias como cantor de soul. Isso faz esse projeto ser um acerto preciso em suas dezenas de faces, uma vez que conversa com uma oratória bem clara e desenvolvida com seu público, que está em uma gula insaciável por hits e mais hits devido a baixa quantidade de material de grandes artistas pop desse ano. Contudo, é aqui que vem o pulo do gato, ao invés de se deixar levar totalmente a esse público, o artista também conversa com aqueles que preferem mergulhar no oceano de narrativas interligadas, formulando uma arte com uma quantidade exorbitante de correntes marítimas, frias e quentes, para o ouvinte se deixar levar e se deleitar.

Todavia, nem tudo são flores. A memorabilidade desse álbum é fortemente afetada pela ausência de um fator chave em qualquer projeto: a consistência na qualidade da produção. O apelo ao pop por vezes soa exagerado, como se a gravadora houvesse exigido que os instrumentais fossem hiper-produzidos sem um verdadeiro motivo por trás, apenas para agradar a radiofilia que persegue esses cantores pop com uma forte veia artística. Entretanto, nada disso ofusca o quão corajoso e bem-sucedido Hozier foi em compor uma rede lírica extremamente grossa e vigorosa nesse triunfante esforço. Se ele continuar nesse ritmo, é capaz que uma obra-prima venha a seguir.

Selo: Columbia
Formato: LP
Gênero: Pop / Cantor-Compositor, Pop Soul
Sophi

Estudante, 18 anos. Encontrou no Aquele Tuim uma casa para publicar suas resenhas, especiais e críticas sobre as mais variadas formas de música. Faz parte das curadorias de Experimental, Eletrônica, Rap e Hip Hop.

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