Crítica | The Lamb As Effigy


★★★★★
5/5

A cada dia que se passa, é possível notar o aumento do estresse e desespero do jovem. A ansiedade de saber que é mais fácil que o mundo acabe antes do capitalismo ter seu fim provoca um sentimento de desesperança, que pode levar a uma espiral descendente de desconsolação. Seja o estado do meio ambiente, as condições paupérrimas de vida, seu próprio custo, tudo isso parece um grande ciclo infinito de modo que nada que se possa fazer vá mudá-lo. Ao mesmo tempo, essa fragilidade do estado mental precisa ser deixada de lado se o jovem deseja viver — ele tem de trabalhar. Concomitantemente à desgraça, o cotidiano assombra. Ele reprime o sofrimento, a mágoa pela repetição incessante, e o objetivo de Sprain em orquestrar essa magnânima obra é rasgar grosseiramente o peito do jovem, assim expondo por meio da dor todas as suas feridas antes contidas em uma nojenta sinfonia da desordem. É esplêndido.

Da representação do destino como um grande empecilho à humanidade a crise existencial causada pela indústria cultural, esse álbum brilhantemente constrói suas narrativas em conceitos absurdos, não poupando em analogias e abstracionismos em suas letras. As antíteses e os paradoxos se perseguem em um campo elíptico, mantendo a tensão e natureza desatinada da peça sempre acima do limite. O vocalista prefere usar um tom ignóbil e amedrontador em seus cantos e urros para maximizar sua lírica intrincada, de maneira a soar o mais semelhante a realidade o possível. Os melhores momentos desse projeto desabrocham quando as performances de Alex Kent evoluem ao lunático, ao desequilibrado, enquanto grandes barreiras de noise e guitarras purulentas abafam seu grito de socorro.

Da mesma maneira, a banda nunca falha em compor momentos mais sóbrios, esses que sempre interligam perfeitamente os climaxes descontrolados, normalmente associados à desistência e a exaustão. Analogamente, os conceitos tratados durante o álbum permanecem coesos e paradoxais durante seus 96 minutos, seja o divino como torturador, o sofrimento cultuado, ou o sexo como encobrimento da ânsia existencial — tudo sob a perspectiva de serem uma só coisa. O resultado é feio, desagradável, mas brilha em sua nudez, como aos prantos é vocalizado por Kent. Não apenas isso, o niilismo exibido é em sua base, só isso mesmo: exibido. Não há uma glorificação dessa perspectiva de mundo, apenas um registro de sua horripilante existência, como uma verdade inevitável e infeliz.

Ao que tange os instrumentais, a banda gira em uma valsa ao redor de um vai e vem infindo, que remove ou adiciona as texturas ideais para uma progressão ímpar de ideias a priori desconexas, mas que a banda conecta como um quebra-cabeça. Uma podridão seguida de alívio, seguida de horror, seguida de vazio. Todas as formas possíveis de dor estão presentes aqui, a todo momento. Até em seus momentos mais calmos, Sprain consegue representar com exatidão como é viver à margem da sociedade: tudo é aflição. É uma obra-prima que exibe o conhecimento profundo de cada elemento que a influenciou, e o resultado é uma mistura gosmenta infestada de larvas em um chifre oco de gado em forma de rock experimental. É a experiência mais visceral de 2023.

Selo: The Flenser
Formato: LP
Gênero: Rock / Noise Rock, Pós-Rock, Experimental
Sophi

Estudante, 18 anos. Encontrou no Aquele Tuim uma casa para publicar suas resenhas, especiais e críticas sobre as mais variadas formas de música. Faz parte das curadorias de Experimental, Eletrônica, Rap e Hip Hop.

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