Opinião | Os truísmos infelizes e estúpidos disfarçados de discurso de Manu Gavassi.


Vídeo da ex-BBB criticando a indústria musical é puramente fajuto e insosso. Quando foi a última vez que ela lançou algo bom pra meter o dedo na cara dos outros?

Nesta quarta-feira (13), Manu Gavassi publicou um vídeo de protesto em suas redes sociais criticando a “indústria fonográfica”. No conteúdo divulgado pela ex-BBB, ela aparece em uma entrevista de contratação realizada por uma agência que lhe oferece inúmeros absurdos em forma de pacotes, que vão desde polêmicas sobre relacionamentos a outros assuntos que hoje agitam o showbiz. Claro que a intenção de apontar problemas em relação ao processamento que temos na música brasileira atual — ou mesmo mundial — é algo substancialmente essencial, mas Manu Gavassi faz isso de forma tão superficial que a impressão causada por ela é a mesma que Katy Perry causou quando lançou “Chained to the Rhythm”.

Na verdade, esse tipo de crítica é algo comum vindo de artistas que, infelizmente, não têm consciência dos verdadeiros problemas sobre o tema. O caminho é o mesmo: descaradamente, após uma baixa em suas carreiras, eles surgem com suas línguas afiadas denunciando os horrores que se passam por trás das câmeras. E, na maioria dos casos, vêem-se numa posição extremamente revolucionária. Contudo, não é difícil compreender que esses takes fazem parte daquilo que esses mesmos artistas criticam, mas que estão inseridos por vontade própria. Manu Gavassi critica o fato de darem mais valor às polêmicas do que à arte. Mas há duas coisas nisso: 1) no caso dela, as polêmicas sempre foram e ainda são, principalmente por meio deste vídeo, sua maior fonte de atenção; porque 2) musicalmente ela é tão desinteressante que sua crítica à desvalorização da arte nem faz sentido — ela mesma não consegue perpetuar esses valores. Quando foi a última vez que Manu Gavassi lançou algo minimamente bom?

Além de tudo isso, o vídeo também contém erros grotescos como caracterizar a MPB como uma monarquia cujos artistas que dela fizeram parte, só eles, pudessem repassar a coroa para novos talentos. Isto é tão falso quanto estúpido: a MPB não existe mais e não tem influência mercadológica de seus nomes na indústria musical neste momento. Em tudo isso, percebe-se a falta de materialismo na análise de Manu Gavassi ao elencar os problemas reais da música. Em nenhum momento ela menciona a raiz da questão: o capitalismo. E muito menos dá nome aos bois: o grosso volume de controle do sertanejo e dos latifúndios em todos — sem tirar ou colocar — possíveis espaços de criação, promoção e fortalecimento da música no Brasil.

É por estas e outras razões que não podemos levar a sério este tipo de posicionamento crítico. Não que todo protesto no mundo musical precise seguir uma receita de bolo que diz que se deve, acima de tudo, criticar o capitalismo e a música sertaneja. Embora as falas desmazeladas de Manu Gavassi contra as agências e gravadoras de artistas musicais tenha um viés antissistêmico, parece mais uma crítica ao corporativismo do que à forma como essas relações de trabalho e criação ocorrem no meio artístico e musical. Além disso, há também um classicismo inato na forma como é representado o público consumidor dos artistas ali criticados. Não devemos julgar uma pessoa que se interessa por um cantor pelas suas polêmicas, pois, na verdade, existe toda uma rede perversa que o faz desenvolver esse interesse, seja de forma exógena, como a busca por coisas acessíveis graças à realidade implacável de todo cidadão médio, ou mesmo a falta de identificação que nós, como sociedade, acabamos distorcendo de acordo com as mudanças no ambiente em que estamos inseridos.

É necessário um esforço muito maior para fazer críticas verdadeiramente genuínas à alienação resultante dos processos artísticos de massa. Enquanto não fizer isso com seriedade, Manu Gavassi continuará sendo o gatilho para truísmos infelizes e estúpidos disfarçados de discurso, ou seja, um resumo do que ela mesma representa como personalidade midiática.
Matheus José

Graduando em Letras, 23 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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