Crítica | Prece



★★★★★
5/5

O novo álbum de Luiza Brina é diferente de tudo que ela já fez. Claro que saber disso pode não ser algo que te atraia num primeiro momento: a música da artista, apesar de sempre entorpecida de qualidade, permaneceu encoberta pela névoa do alternativo desde que ela começou a surgir em cena com o álbum A Toada Vem É Pelo Vento, de 2011, posicionado em 80º lugar na minha lista de melhores discos brasileiros da década de 2010. Mas em Prece há muito para descobrir — e sentir — quando se caminha em direção à delicadeza intercalada em onze peças autorais e profundamente sensoriais.

Guiada pelo que a fez se sentir bem nos momentos difíceis, Luiza canta composições que levou anos para terminar. São as suas orações que emergem para além de um fado religioso, exaltando, em tudo isto, o poder da conexão. E isso fica evidente em “Oração 2”, parceria com a mexicana Silvana Estrada. Na faixa, os acordes já expressos na introdução “Oração 1” ganham força com a percussão e os arranjos de cordas condensados pela música de concerto, também presente no restante da obra e executados por uma orquestra composta apenas por mulheres.

Na prática, esse refinamento musical ganha destaque à medida que os principais elementos se chocam, como em “Oração 18 (pra viver junto)”, em que o vocal da artista muda de tom conforme sua exclamação é fortemente enviesada por uma emoção tetânica: “Pra viver junto, é preciso poder viver só”, canta ela, buscando um entendimento baseado no amor que só é preenchido com uma compreensão maior, seja da vida ou de si mesma.

O mais interessante de tudo é que o trabalho de composição musical — em oposição ao lírico — consegue propor mais do que o tema da conexão e da intercorrência da fé, seja ela qual for, como auxílio em tempos de tormenta. Há, aqui, na sonoridade que também remete aos ritmos afro-brasileiros, uma construção de espaço, um forte teor de música ambiente (“Oração 19 (oração pra Oxum)), que se cruza a todo momento com a crueza das representações pessoais de Luiza (Oração 17 (risco)). Esta imensidão de detalhes, sons e atmosferas nunca colide com a beleza cuja sensibilidade parece remeter a todo momento. “Basta olhar pra trás, despedir, recomeçar”.

Selo: dobra discos
Formato: LP
Gênero: Pós-MPB
Matheus José

Graduando em Letras, 23 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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