Crítica | “The girl, so confusing version with lorde”


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Em momento meta, Charli xcx traz Lorde para cantar no remix de música cujo assunto é a própria.

É indiscutível que Charli xcx dominou tópicos de discussão entre os fãs de cultura pop em 2024. Seja com a capa minimalista, um clipe abarrotado das mais diversas it-girls da gen Z ou o assunto por trás das letras de seu novo álbum, BRAT, lançado no começo do mês. A cantora inglesa tem provado que sabe exatamente como servir ao pop e aos seus fãs. Dessa vez, em um momento meta, Charli xcx traz Lorde para cantar no remix de música cujo assunto é a própria.

A faixa “Girl, so confusing” já se tornou ponto de especulação antes mesmo de ser lançada, quando Charli discorreu sobre suas inseguranças em relação à neozelandesa em uma entrevista para a Rolling Stone. O disco saiu e confirmou o óbvio: a faixa se tratava de Lorde, mas não em tom pejorativo, mas sim sinalizando as ansiedades da inglesa quanto ao seu sucesso e questionando a real natureza da aparente indiferença de Lorde com ela. Mas, assim que o álbum sai, Lorde vem à público em suas raras aparições no Instagram para aclamar o projeto e sinalizar como se sente inspirada pela artisticidade de xcx. Dias depois, esteve presente em uma apresentação da inglesa em Nova York. Parecia que tudo havia sido resolvido, mas a real confirmação veio em forma de música. Como a própria Lorde diz em seu verso, “vamos resolver isso no remix”.

Ao contrário dos remixes de “Von Dutch” e “360”, aqui Charli e Lorde seguem a estrutura original da faixa, apenas substituindo um verso existente por outro, no caso, o ponto de vista da convidada. O interessante é que a nova versão apenas reafirma a tese da música: é confuso ser menina. Charli já comentou diversas vezes, quando questionada, sobre a canção ser um desabafo sobre as expectativas de uma mulher, que, por convenção, precisa ser amiga de todas as mulheres em nome do feminismo, quando na verdade os relacionamentos possuem muitas nuances e particularidades que acaba tornando duas pessoas incompatíveis, como ela acreditava ser o caso de sua amizade com Lorde. Quanto às personalidades, é difícil argumentar, mas musicalmente o remix prova o contrário; conforme especulado pela própria Charli, suas vozes se combinam naturalmente, e ter ambas discutindo seu relacionamento adiciona mais camadas ao que já havia sido prescrito na música original. Tendo elaborado as letras do álbum para soarem como mensagens de texto, o tom coloquial, de conversa, eleva o conceito ao seu maior ponto de clareza.

É impressionante como Lorde entra em uma faixa de um álbum já lançado e com seu verso reafirma não apenas toda temática da canção por um ponto de vista diferente, mas captura a essência do disco como um todo em algumas de suas frases (“It’s self defense until you’re building a weapon”), além de trazer o tom característico de suas obras ao captar angústias de sua geração perfeitamente, como inseguranças com corpo e autoimagem, pontos já tocados em seus projetos, provando como sua artisticidade é tão singular e autoral, e como faz falta. No fim, apresenta sua redenção ao conflito de forma sensível, que finaliza toda a ideia perfeitamente (“Forgot that inside that icon, there’s still a young girl from Essex”).

A faixa pode não ser uma das melhores do álbum, e provavelmente não seria a primeira escolha para um remix enquanto se espera o relançamento, mas acaba ampliando a nova versão. O fato de ser um evento além de apenas uma música reforça o manifesto que Charli xcx apresenta com o lançamento de BRAT, sendo um disco que vive além da obra principal e movimenta constantemente a cultura pop em torno dela. BRAT é um álbum de quinze músicas, mas também um deluxe com mais três faixas, três remixes, um mural em Nova Iorque, um evento no Boiler Room e tudo que é verde espalhado pelo mundo. Um movimento tão poderoso que fez Lorde sair do seu habitual hiato entre seus álbuns para esta breve aparição, que encanta e emociona qualquer ouvinte.

Selo: Atlantic Records
Formato: Single
Gênero: Pop / Electropop
João Agner

joão agner (2003) é escritor e graduando de jornalismo. escreveu sua primeira história aos oito anos, e tem explorado diversos formatos desde então, como não ficção e poesia. é fascinado por música desde sempre.

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