Crítica | Mofo


★★★★☆
4/5

Em Mofo, Digestivo cria uma fusão regional, mas nunca limitada, entre a música eletrônica e as raízes locais que circundam sua cidade natal, Belém do Pará. O álbum proporciona uma verdadeira transgressão entre ritmos sintéticos latino-amazônicos, favorecendo uma profundidade de sentidos necessária para compreender como a sonoridade aqui explorada encontra fluidez na experimentação correspondente ao contexto físico da obra.

Há, na música eletrônica, uma tentativa de homogeneizar alguns aspectos da composição que remetem a um determinado uso estético e funcional, seja de equipamentos ou mesmo de gêneros explorados por diferentes artistas. Isso é um erro, já que a pluralidade e a linguagem da criação independem uma da outra, e Mofo vai de encontro a esse pensamento, já que as ideias de Digestivo encontram força própria em ambientes estridentes, com sintetizadores metálicos ditando o ritmo o tempo todo.

“Fungi” inicia a jornada de Digestivo em sua construção musical crônica, com ajustes robustos de sintetizador em contato constante com a textura áspera bordada a ferrugem, mesclando umidade com fragmentos percussivos que percorrem o álbum do início ao fim. Na microssômica “Acaro”, as batidas são rapidamente perturbadas por snares eletrificados que desencadeiam uma dezena de distorções, das quais vibram à medida que sons escorregadios e líquidos introduzem os minutos iniciais da música. Neste ponto, é necessário mencionar como o Mofo busca se comunicar com a expressão multidisciplinar de Digestivo.

Seria muito simples misturar estéticas e possibilidades musicais de gêneros eletrônicos como IDM e hard drum e dizer que pronto, esse é o som amazônico. Mas não, pois desde o título das faixas, que se relacionam quase literalmente com o seu interior, com referências à micologia que servem de pano de fundo a muitas das sensações aqui criadas, o que vemos neste álbum é um método inventivo de representação e estilo, com distância de experimentação que pouco se faz vigente na música eletrônica do Brasil.

Selo: Acta
Formato: LP
Gênero: Eletrônica / Experimental
Matheus José

Graduando em Letras, 23 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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