Crítica | Alligator Bites Never Heal


★★★☆☆
3/5

Alligator Bites Never Heal consolida um futuro promissor, ainda que incerto, para Doechii. Nascida na Flórida, a rapper estadunidense conquistou seu espaço no hip hop de forma gradual desde sua estreia em 2018. Agora ela começa a engatinhar na música pop após um ótimo começo de ano ao conquistar o público com a divertida hip house “Alter Ego”, single com participação de JT do duo City Girls.

A nova mixtape nasce após um bloqueio criativo da artista e uma ruptura com as expectativas de sua gravadora para o primeiro álbum. Para aquecer sua caneta, Doechii deu início ao projeto Swamp Sessions, que consistia em compor músicas sob o tempo cronometrado de uma hora. O resultado surpreendeu com faixas pessoais e carismáticas. Porém, para a mixtape, a artista decidiu se arriscar em diferentes gêneros que apontam para onde ela quer ir, mas que escancaram que ela ainda está longe de chegar até lá.

Alligator Bites Never Heal reúne alguns dos destaques dessas sessões. A estrondosa “NISSAN ALTIMA” combina uma minimalista, porém eficaz, produção de trap com um flow que exala confiança (“Eu sou a nova Madonna do hip hop, eu sou a Grace Jones do trap”). Já a satírica “BOOM BAP” resgata o clássico ritmo da Costa Leste dos EUA como resposta às expectativas que a gravadora e os fãs depositam nas costas da artista — deixem ela cantar um pouco!

Ainda que por vezes impolida, Doechii se destaca por sua habilidade em contar histórias e explorar narrativas magnéticas em suas linhas. Em “DENIAL IS A RIVER” acompanhamos um diálogo hipnotizante entre ela e sua consciência que flui da descoberta de uma traição até a confissão de um vício em drogas. “DEATH ROLL” dá continuidade aos temas mais sombrios com guitarras melancólicas enquanto a rapper aborda seus mecanismos de defesa para reprimir a dor.

Se antes Kendrick Lamar e Nicki Minaj chegavam a ser incorporados por Doechii, desta vez ela consegue utilizar suas inspirações como bússola para chegar a um lugar mais autêntico. “GTFO”, parceria com KUNTFETISH, une um electro hop contagiante com uma interpolação de “Move Bitch”, do rapper Ludacris, para criar um momento sereno e envolvente.

O projeto perde força na reta final com uma mudança brusca na sonoridade. R&B genérico e performance vocal abaixo da média (“SLIDE”), trap onírico que funciona como sonífero (“FIREFLIES”) e uma tentativa anêmica de soar lo fi (“ALLIGATOR BITES NEVER HEAL”) encerram a mixtape deixando um retrogosto amargo na boca. Talvez a gravadora tenha razão em querer que Doechii permaneça no rap.

Selo: Top Dawg
Formato: Mixtape
Gênero: Hip Hop / Pop rap, R&B contemporâneo
Tobia Ferreira

Emo de banho tomado e quase jornalista cultural. Graduando em Jornalismo pela USP e repórter do Aquele Tuim, em que faz parte das curadorias de Experimental, Eletrônica e Funk e R&B e Soul.

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