Crítica | Viewfinder


★★★☆☆
3/5

Em sua obra “Sobre a Fotografia”, Susan Sontag afirma que “fotografias são uma forma de aprisionar a realidade”. A escritora observa que não se pode possuir a realidade, mas pode-se possuir imagens; não se pode possuir o presente, mas pode-se possuir o passado. É nessa premissa entre a transitoriedade e as formas de observar e guardar momentos que, Viewfinder, o novo álbum de Wendy Eisenberg se concentra.

Em Viewfinder, as faixas se estendem, respiram, e o tempo parece fluir de forma diferente, mais livre. O destaque para as durações das músicas não é apenas uma questão técnica; é o espaço que elas criam para algo mais profundo. Aqui, o tempo flutua, criando um ambiente quase cinematográfico, e a sensação é de movimento constante, como se estivéssemos vivendo o momento que antecede algo grande.

O disco começa com “Lasik”, faixa que destaca Eisenberg como um artista sensível aos detalhes. Quando Wendy canta “changing isn't healing”, a frase soa simplesmente verdadeira, como uma constatação resignada de que nem toda mudança nos proporciona cura. Essa clareza, por mais desejada que seja, não resolve tudo. É um lembrete ao mesmo tempo conformado e surpreso de quem compreendeu que os significados se encontram para além do que conhecemos.

O jogo entre voz e instrumento ao longo do álbum é um dos seus grandes triunfos. As batidas irregulares e os instrumentos desconexos se unem de uma maneira que parece ao mesmo tempo improvisada e intencional. Eles não apenas acompanham a voz de Wendy; eles a evidenciam, a convidam e criam um espaço favorável para que ela aconteça. A sensação é de que a música está sempre em movimento, sem nunca se fixar por completo.

"Viewfinder Intro" soa como o momento antes da captura, antes da revelação total. Não se trata de congelar o tempo, mas de explorar a transitoriedade — o momento antes de percebermos que algo nos será caro e a busca por maneiras de viver aquilo. Como ver a vida claramente? Na faixa seguinte, “Viewfinder”, essa ideia se aprofunda. Agora é como se estivéssemos prestes a capturar o momento, mas ainda à espera do instante decisivo, como quando esperamos enxergar o momento perfeito para viver algo. Não demora muito para que Eisenberg nos lembre de que: “seeing things could never be enough”, afinal, existe sempre o que fica para fora da lente.

A faixa que encerra o disco, “In the Pines”, é uma canção que lida com as dificuldades de encarar o que um dia já foi presente. Aqui, a música trata especialmente da forma como as pessoas que um dia amamos podem nos assombrar, mesmo quando não estão mais por perto. “Can you see me?”, ecoa em grande parte da canção, como se em uma última tentativa de tentar fazer sentido do passado.

No fundo, Viewfinder não é um álbum sobre ver o tempo congelado, mas sobre os momentos contínuos que antecedem esse congelamento. É sobre o movimento presente, sobre as coisas que estão prestes a acontecer, mas ainda não se revelaram por completo. A vida, como Wendy Eisenberg parece sugerir, está nesse fluxo contínuo de transitoriedade — no espaço entre a mudança e o conhecido, no intervalo entre a memória e o esquecimento.

Selo: American Dreams Record
Formato: LP
Gênero: Folk / Experimental, Jazz
Mateus Carneiro

Graduado em Letras pela UTFPR. Tenho interesse por diversas formas de expressão artística, como a literatura, o cinema e outras manifestações culturais. No Aquele Tuim, participo da curadoria de Folk, onde escrevo sobre o que me instiga no mundo da música.

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