Crítica | SE EU FOSSE UMA GAROTA BRANCA


★★★☆☆
3/5

O álbum de estreia de KING Saints, SE EU FOSSE UMA GAROTA BRANCA, possui uma peculiaridade instigante desde seu título. O projeto chega após 12 anos em que a artista atua na indústria da música nacional através de parcerias e colaborações para trabalhos de outros artistas, como DOCE 22, de Luísa Sonza, e AFRODHIT, de IZA.

Ainda que com forte influência do hip hop já familiar em seus lançamentos, desta vez a cantora investiu em uma sonoridade pop diversificada e expansiva em relação à sua discografia até então. Ela consegue criar um universo imperfeito e chamativo ao longo dos 28 minutos do projeto, apostando no humor e na desinibição para abordar questões sérias.

A faixa-título, por exemplo, se apropria de trompetes esterilizados e teclados inofensivos para fazer um pop chiclete mascado por muitas artistas brancas sem personalidade. Os vocais caricatos de Saints são tão certeiros que é impossível não ouvir uma familiaridade com os da nepo baby it girl Vivi. A letra ironiza a branquitude que posa de inocente e chega até a fazer uma indireta para o caso de racismo cometido pela cantora Luísa Sonza, com quem Saints trabalhou junto em 2021: “Tem sempre uma guria me pedindo um copo d’água / Aí de mim se eu ainda ficar indignada”.

As participações especiais dão um charme a mais para as faixas mais estranhas do projeto. A mamacita Karol Conká traz comodidade em “KANHOTA”, em que uma percussão seca guia a música enquanto KING Saints violentamente ordena que alguém taque e não pare. Já MC Soffia é convocada para o beat tropical de “CINDERELA” com uma narrativa confusa e envolvente de uma brisa bem torta.

O álbum ainda abre espaço para que Saints se aventure em outros gêneros. “DANÇAR”, com participação de Leoni, incorpora uma linha de baixo safada e coros adocicados em um disco singelo, porém imersivo. “CALOTEIRO”, com Mc Danny, introduz um violão dedilhado e uma flauta hipnótica em uma nova “Bitch Better Have My Money” versão pisadinha.

Os momentos mais fortes de KING Saints são, no entanto, com o rap mais puro. “CADELA” reúne Levinsk, Boombeat e Afrodite Bxd para encerrar o álbum com um compilado de rimas sobre a cena em que a anfitriã brilha com sua entrega fluida. O mesmo pode ser dito de “SE PREPARA MONA”, em que graves pesados e um sample de “Montagem Guerreira”, de Tati Quebra Barraco, tornam-se coadjuvantes diante do protagonismo vocal da artista.

É curioso como o estranhamento em SE EU FOSSE UMA GAROTA BRANCA parece ser o fio condutor do projeto. Não por conta de experimentações ousadas, mas por escolhas não óbvias — bem ou malsucedidas — que tornam o álbum muito mais interessante em sua produção e performance vocal. KING Saints aparenta ser uma artista com muito a dizer, e é através do inesperado que ela se faz ser ouvida.

Selo: Head Media
Formato: LP
Gênero: Pop / Pop rap

Tobia Ferreira

Emo de banho tomado e quase jornalista cultural. Graduando em Jornalismo pela USP e repórter do Aquele Tuim, em que faz parte das curadorias de Funk e R&B e Soul.

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