Crítica | Earth Focus


★★★★★
5/5

O álbum Earth Focus é a materialização mais próxima da perfeição na estética de unir a natureza com o ambiente urbano. As paisagens sonoras são cuidadosamente construídas com essa dualidade, a ponto de fazer o ouvinte se alinhar à música e criar uma conexão pessoal com o que está sendo transmitido. Cada elemento sonoro parece convidar para uma reflexão interna, e o álbum não apenas desperta sensações, mas também propicia um encontro íntimo com a música.

Esse trabalho se apresenta como uma repaginada brilhante do que a música ambiente pode oferecer. Mesmo para quem já tem familiaridade com o gênero, a proposta aqui é notavelmente distinta, com uma entrega excepcional. A qualidade da produção é evidente, e a forma como a música é construída e apresentada, reflete um domínio da técnica e da sensibilidade interposta pelo tema da obra.

Earth Focus é, sem dúvida, uma trilha sonora perfeita para momentos introspectivos, quando estamos refletindo sobre nossas vivências. A faixa de abertura, “Concrete River”, é um início perfeito para essa jornada. A paisagem criada aqui parece envolver o ouvinte em uma cúpula simbólica que separa o urbano da natureza. No entanto, à medida que a música avança, essa divisão vai se dissolvendo, até que os dois elementos opostos se harmonizam, como se ambos os mundos estivessem conectados e coexistissem em equilíbrio.

Em faixas como “How We Got Here”, “Shorter Lifespan” e “Architectural Plans”, há um sentimento comum de introspecção profunda, quase como se estivessem construindo uma trilha sonora para aquele momento em um filme em que os personagens resolvem seus conflitos e criam memórias de felicidade duradouras. Essas faixas trazem um tom pessoal, como se o ouvinte estivesse vivenciando sua própria transformação emocional.

Em particular, “How We Got Here” traz um instrumental mais eufórico, que nos leva à sensação de estar caminhando para o além. Não há necessidade de mover-se fisicamente; basta colocar a música para tocar e se entregar à experiência. As percussões são mais focadas nas texturas digitais, mas sempre com a presença de elementos orgânicos, o que cria uma sensação de movimento contínuo e fluido. Já em “Shorter Lifespan”, a predominância de sons modificados afasta-se um pouco da estética orgânica, mas o que se destaca aqui é o "vácuo" sonoro, uma reverberação inicial que vai se expandindo e se transformando em uma construção gradual, como uma galáxia que lentamente forma seus sistemas.

“Scale The Model” e “Taking Action” introduzem uma mudança brusca na direção do álbum, com faixas mais soturnas e intensas. Embora essas músicas, em um filme, pudessem representar o clímax da narrativa, o ponto de maior tensão, a ideia de um conflito entre o urbano e a natureza não se concretiza aqui. Na verdade, ao longo de todo o álbum, não há um embate entre essas esferas; elas nunca se sobrepõem, mas coexistem de forma harmônica. Mesmo nas peças mais intensas, a música mantém a fluidez e a integração dos dois mundos, sugerindo que, em vez de oposição, há uma interação respeitosa e complementar entre eles.

Para mim, a conexão mais pessoal e profunda ocorreu nas faixas “Grows Along The River Slow” e “Grows Along The River Fast”. Essas músicas evocaram memórias angustiantes, mas também foram uma forma de reconstrução, como se estivessem desconstruindo e, ao mesmo tempo, ressignificando momentos dolorosos da minha vida. A música se transformou em uma espécie de metáfora para entender que, embora as memórias possam ser difíceis, elas são fundamentais para moldar quem somos. Foi durante uma viagem de ônibus para a faculdade, em um dia chuvoso, que essas faixas me tocaram profundamente e criaram a vontade de falar sobre elas desse modo mais pessoal.

O álbum é finalizado com “Generations and Generations”, que encerra o trabalho de forma esplêndida. A música transmite uma sensação de conforto e de conclusão, como se o ciclo de emoções estivesse chegando a um fim suave. O sentimento de acolhimento parece ser uma recompensa pelo que foi vivido durante toda a jornada sonora. Esse fechamento não é apenas uma finalização musical; é uma sensação quase tangível de que, ao longo dessa experiência, houve uma transformação.

Earth Focus oferece uma experiência imersiva, em que cada faixa evoca sentimentos e reflexões pessoais, permitindo que o ouvinte se conecte com suas próprias vivências. A música, ao misturar elementos orgânicos e digitais, se torna uma moldura para as emoções e memórias de quem a escuta. Ao final, Earth Focus é mais do que uma experiência auditiva — é um convite a se perder e se encontrar na sua paisagem sonora única.

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Selo: WESTERN VINIL
Formato: LP
Gênero: Música Ambiente / Experimental, Eletrônica
Antonio Rivers

Me chamo Antonio Rivers, graduando em História, amazonense nascido em 2006. Faço parte do Aquele Tuim, nas curadorias de Experimental, Eletrônica, R&B e Soul.

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