Crítica | FALA


★★★★☆
4/5

Foram necessários anos (seis para ser exato) para que o coletivo de artistas Teto Preto retornasse com um novo álbum. FALA sucede o excelente Pedra Preta, um dos melhores álbuns dos anos 2010 e que hoje pode ser visto como a justificativa perfeita para um material novo que daria continuidade às suas explorações já muito noturnas para a nossa realidade naquela época não tão distante.

FALA é a consumação dessa força que Teto Preto tem de vagar por um instinto temático que tem como foco, da sua concepção à sua execução, a vida noturna predominantemente da cidade de São Paulo, mas que por questões de linguagem — a própria ideia de se encaixar com um grau de liberdade em qualquer situação que siga essa predisposição — se torna, mais do que nunca, frequente e adaptável a inúmeros contextos.

Essa universalização é resultado direto da forma como FALA se estrutura a partir de uma robustez temática atrelada a ritmos dançantes, que, ao adotar espaços mais dinâmicos – uma forma lírica muito próxima do que conhecemos do pop brasileiro atual, porém mais inteligente e sem necessariamente focar em rimas –, consegue soar fluída e extremamente contemporânea. Essa é, de fato, uma das maiores marcas registradas do Teto Preto: tudo o que eles (o grupo) fazem recebe a descrição quase imponente de deslocamento para uma realidade narrativa e musical que tangencia os extremos da atualidade.

É uma noção que não só se encaixa com os arranhões instrumentais do pós-industrial, como também compõe uma atmosfera futurista afetada pelos males que, mesmo diante dos avanços tecnológicos e sociais, ainda persistem, fragmento que pode ser visto no verso: “Daquilo que eu não quero / E é fruto da impotência / Pro mundo que desejo / Enxergo violência”, de “A TUA ONDA *.* ATO”. Ou mesmo a frase “O ódio é democratico e eu aceito”, de “FALA *.*” em parceria com Saskia.

Por muito tempo, Pedra Preta virou sinônimo de álbum representativo, seja para a comunidade LGBTQIAP+, seja para o que ele mesmo expôs e que é, de certa forma, o suficiente para ver que a música, a sonoridade e a ideia que pairava ali eram maiores do que qualquer classificação imposta, seja de gênero ou estilo. Isso parece se repetir em FALA, mas de uma forma incrivelmente próxima do contexto atual em que estamos inseridos.

FALA também é muito firme nessa estética mista de eletrônica e temas que se tornam sensuais por serem diretos, robustos e agressivos. Poucos álbuns transmitem mensagens da forma que esse faz, poucos álbuns conseguem transmutar suas raízes, acenar para seu passado e soar novo. 

Selo: MAMBArec
Formato: LP
Gênero: Eletrônica / EBM, Pós-Industrial

Matheus José

Graduando em Letras, 23 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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