Crítica | Vazio Obsceno


★★★★☆
4/5

Vazio Obsceno é o álbum de estreia de MADRE, projeto solo da cantora e compositora Luiza Pereira, ex-integrante da banda INKY. O disco surge como um manifesto anti-digital, refletindo as inquietações de Luiza sobre o impacto das plataformas de streaming na indústria musical, em especial a não-remuneração justa e a precarização do trabalho dos artistas. Com uma sonoridade crua e visceral, Vazio Obsceno questiona a dinâmica imposta pelas grandes empresas de distribuição digital, propondo uma reflexão sobre o valor da música e a autonomia do artista em um cenário cada vez mais controlado pela lógica do consumo imediato e da desvalorização cultural.

O álbum traz à tona uma sonoridade crua e intensa, explorando temas de angústia, busca por liberdade e desejo de reparação. Em “DE UM JEITO OU DE OUTRO”, a mistura garage-blues se destaca com guitarras distorcidas e riffs diretos, criando uma atmosfera devidamente pesada. A canção expressa a frustração de se sentir injustiçado, o peso do karma e a esperança de uma reparação. Já “LÁ LONGE NO ESPAÇO" mergulha em um clima denso e agressivo, com ruídos graves, que refletem o desejo de liberdade e um misticismo que permeia os devaneios da artista. Em “TRANSE”, a batida áspera e energética transmite uma sensação catártica, expressando desejos internos, uma sede de vida e a busca por experiências que saciem uma necessidade profunda de intensidade e paixão. Por fim, “CAOS” traz um riff sombrio e angustiante, reminiscente de uma marcha fúnebre. A música evolui lentamente, capturando a sensação de desgaste e desilusão, especialmente refletida no contexto da pandemia de COVID-19. A canção retrata a busca urgente por algo que substitua o vazio, uma tentativa de escapar da exaustiva sensação de caos e de encontrar um novo significado para a realidade.

O Lado B apresenta uma continuidade na exploração sonora e emocional de MADRE. “TENTO” traz uma balada introspectiva com guitarras grunge e um refrão instrumental que transmite a sensação de que o pensamento profundo pode ser uma armadilha para a loucura. A canção é sobre a tentativa de fuga para um espaço mental onde tudo pode ser recriado e reconfigurado. Em “AZUL IMENSO”, a sonoridade meditativa e suave com uma harmonia simples e repetitiva reflete a vastidão emocional e a profundidade de sentimentos, criando uma atmosfera fluida e expansiva, como se estivesse imerso em um espaço sem fim. “FANTASMA”, com riffs expressivos que se alinham à sensação de deslocamento e dificuldade de se encontrar, explora a estranheza e a busca por sentido em meio ao vazio, um "fantasma" que assombra a busca interior.

Já em “SIRENES”, as linhas de guitarra e os synth arpeggios se misturam com batidas rápidas, lentas e complexas, criando um ambiente de alerta, tensão e inquietação. A música é um constante jogo de suspense e desconforto, reverberando emocionalmente e gerando uma sensação palpável de angústia. Em certos momentos, a canção traz à mente a sensação de estar dentro da música "Everything In Its Right Place" do Radiohead.

Nesse sentido, Vazio Obsceno é, ao mesmo tempo, um álbum inquietante que mistura elementos meditativos para expressar intensas emoções de frustração, enquanto revela a busca pela autodescoberta. Através de um ambiente imersivo e emocional, a obra reflete a angústia e a procura por sentido, tanto na realidade quanto no espaço mental e emocional de MADRE.

Selo: Seloki Records
Formato: LP
Gênero: Rock / Rock alternativo
Brinatti

Cientista Social com ênfase em Antropologia e Sociologia, 27 anos. É redator e repórter no Aquele Tuim, participando das curadorias de Funk e Pop.

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