Lançando a mixtape Fuga da Roça, MC FREITAS ZS conversa com o Aquele Tuim sobre sua explosão criativa em 2024, amizade com d.silvestre e até Katy Perry.
Samplear o filme A Fuga das Galinhas (2000) em um projeto de funk pode parecer fora do comum para alguns artistas, mas não para MC FREITAS ZS. Em meio ao lançamento da mixtape Fuga da Roça nesta sexta-feira (31), o artista conversou com o Aquele Tuim sobre sua explosão criativa em 2024, seus primeiros contatos com o funk e o que espera do futuro.
Morador de Juquitiba, na Zona Sul da região metropolitana de São Paulo, o MC acumula um volume impressionante de lançamentos para quem entrou em atividade em 2023. Somente no ano passado, foram 3 álbuns (Destrói Infância, Inimigos do Silêncio e Expedição a Terra do Funk), 2 EPs (Nas Trevas Com Elas e ESTRANHAGEDON) e inúmeros singles. Ele ainda ostenta parcerias com d.silvestre, Th4ys e outros grandes nomes da cena.
O novo trabalho chega com uma expectativa alta. Em comemoração ao lançamento de Fuga da Roça, FREITAS organizou uma festa gratuita no Viko’s Bar, na Barra Funda, no mesmo dia em que a mixtape viu a luz da noite. Muito animado para o evento, ele garante que será inesquecível: “Vai ter open de alface, porrada com o Freud… Vai ser loucura, velho”.
Além do anfitrião, a festa conta com um lineup de peso, com os DJs Lorrany, Erick JPG, Tormenta, Keu, Lucas Kid, Henriq e Tambara. “Eu acho que vai ser muito diferente, vai ser um rolê totalmente a minha cara. Vai tocar a música do iCarly, vai tocar Katy Perry, vai tocar rock, vai tocar funk, vai tocar tudo, tá ligado?”
Fugindo da roça
Quando questionado em relação a como descreveria a Fuga da Roça, ele explica:
“Eu acho que eu descrevo como algo de libertação. Pode ser libertador para mim, pode ser libertador para todos. É a fuga de cada um, tá ligado? É a fuga que você sai do seu serviço às 17h. É a fuga do seu patrão chato, é a fuga de tudo, tá ligado?”
“Para mim, seria a fuga da roça. Não que necessariamente aqui seja ruim para mim, porque eu adoro morar aqui. Só que o que eu quero para minha vida, não convém tanto eu morar aqui”, afirma em seguida.
Com 11 faixas, Fuga da Roça reuniu amizades e grandes admirações de FREITAS. A mixtape conta com a participação de d.silvestre, Th4ys, DJ Lorrany, MC DENADAI e outros nomes de grande relevância no funk. O artista conta que se emocionou ao trabalhar com pessoas da cena que ele admira.
“É bizarro, porque, tipo, eu olho aqui na janela da minha casa, não tem nada… Tipo assim, bem parado. Mas aí eu olho o celular, tem mensagem do pessoal: "Vamos fazer música, vamos fazer música". É muito estranho porque tá parado aqui, mas no celular tá, tipo, acontecendo a fuga literalmente, tá ligado? Isso é muito daora.”
No ano passado, MC FREITAS ZS teve uma ascensão criativa espantosa, quantitativa e qualitativamente. Seus projetos chegaram a ser mencionados em algumas das listas de melhores do ano de 2024 deste portal. Inimigos do Silêncio entrou na lista de meio de ano dos melhores projetos de funk, enquanto Expedição a Terra do Funk foi incluído em melhores discos de funk, melhores discos brasileiros e melhores músicas, representado por “Pássaros Safadinhos do Helipa”.
Quando perguntado se há algum projeto favorito entre os do último ano, Inimigos do Silêncio é respondido de prontidão. “Eu não tenho muito costume de ouvir muito minhas músicas quando eu lanço. Eu sempre fico escutando várias músicas aleatórias. Mas esse álbum aí é quente, mano. Sempre quando toca no aleatório eu não pulo, eu deixo tocar. Se tocar uma faixa desse álbum, toco inteiro.”
FREITAS já tem um sucessor da mixtape encabeçado: “o nome vai ser Escola de Rock ou Seleção do Mandela”. O futuro projeto promete muitos samples de rock, ainda que o artista deva desacelerar o ritmo de lançamentos nos próximos meses.
Inspirações para a fuga
O MC também comentou sobre sua amizade com o produtor d.silvestre. “Eu dei um salve nele, falei: ‘Mano, você é mó bom, por que você não faz uma música assim e tals?’. Aí ele me respondeu no TikTok. A gente começou a conversar todo dia, todo dia, todo dia. Ele lá em Rondônia, eu aqui em Juquitiba. E a gente foi ficando próximo, tá ligado? Aí hoje nois é irmãozasso.”
“O d.silvestre é a minha maior inspiração, por conta do que ele é, do que ele representa. Porque o cara saiu de lá de Rondônia e veio para São Paulo furando a bolha, tá ligado? Furou a bolha pra caralho. Isso é fuga da roça, mano”, afirma.
Para além do funk, FREITAS também se inspira em um dos nomes mais importantes para o gangsta rap dos EUA. “Eu acho o Eazy-E muito foda, a história dele. Tipo assim, não fecho com nada desses bagulho, mas, pô, o cara era de gangue, certo? Não sabia cantar, quando ele tava cantando todo mundo deu risada. É o que aconteceu comigo. Quando eu comecei, todo mundo dava risada. Quando o cara acertou, aí, tipo, virou a chave, tá ligado?”
Eclético, ele é categórico quando perguntado sobre qual artista tem mais ouvido ultimamente: “Muita Katy Perry, velho. Voltei lá quando ela fazia música boa. Tipo assim, quando ela veio pro Rio, abriu aquela roupona de pavão, tá ligado? Porra. Nossa, era muito bom. Tô escutando diariamente de novo”.
Samples, acapellas, bailes… e phonk
De Scooby-Doo a Sandy & Junior, MC FREITAS ZS transformou samples inusitados em sua própria identidade. Ele conta que a inspiração para esse estilo de produção surgiu a partir de uma música bem específica. “O artista que eu mais gostava era o MC Japa. Eu sempre gostei dele porque ele sampleava as coisas. A música que eu gosto dele é a que ele sampleia a propaganda do McDonald’s, aí a acapella ele fez um bagulho em cima do bagulho do McDonald’s, mano. Ficou muito bom.”
“Tudo é música. Tipo, você tá aí fazendo a entrevista comigo. Tem um computador aí, se você clicar duas vezes assim na tecla, vai fazer um som, tá ligado? Tudo é música, mano. Qualquer coisa, ó, gelo no copo [ele diz enquanto balança um copo com gelo], música. Tudo é música, cara. Tudo, tudo, tudo.”
Antes de gravar acapellas, o MC se arriscou na produção de beats, mas conta que tinha dificuldades. “Eu sempre fui muito ruim em deixar as coisas no tempo. Eu acho que eu sou bem acelerado ou lerdo. Hoje eu tô aprendendo mais, mas eu não conseguia deixar as produções no ritmo. Ficava sempre fora do tempo. Aí eu conheci o Douglas (d.silvestre), aí ele falou assim: ‘Em vez de você produzir, por que você não canta?’ Aí eu falei: ‘Caralho, uma ideia boa’. Aí eu comecei a gravar.”
FREITAS conta que a cena de funk em Juquitiba é quase inexistente. Ele menciona um único local que toca de tudo, menos mandelão. “Quando um parceiro meu deu um salve no dono dessa balada, ele disse que não queria contratar artistas como eu porque não queria que lá se transformasse em um baile do Helipa, tá ligado? Tipo, foi muito zoado o que ele disse.”
“O primeiro baile que eu fui foi o do Casarão, Fusion Fest. Foi ainda quando o [DJ] Arana foi roubado. Aí depois eu comecei a colar para o baile do Bega. Só passarinho que de manhã você fica ‘porra, velho’ [ele imita o som do tuim]. Aí depois eu comecei a colar pros bailes da Norte: 12 do Cinga e Marcone. E depois fui pro Helipa.” Ele comenta que se encantou com as diferenças regionais do funk feito nas zonas Norte e Sul da capital paulista, comparando-as com os diferentes sotaques do interior e da cidade grande.
Em meio à multiplicidade do funk, uma polêmica. FREITAS deixa claro seu posicionamento contrário ao phonk e tudo o que ele representa:
“É tipo deixar o gringo roubar nois, velho. Não pode, mano, tá ligado? Tipo, já recebi proposta de feat com um gringo e não respondi, tá ligado? Não, não fecho. Acho doido. Esses gringos tem que tomar uma madeirada. O phonk é tipo o câncer da Terra, tá ligado? Tem que parar. Tem que parar o quanto antes.”
Da roça para onde?
Nos últimos instantes da conversa, FREITAS aceita participar de um bate-bola.
Tobia: Um produtor?
MC FREITAS ZS: d.silvestre.
Tobia: Um beat?
MC FREITAS ZS: Matemático.
Tobia: Um baile?
MC FREITAS ZS: Bega.
Tobia: Bruxaria ou Ritmada?
MC FREITAS ZS: Ritmada.
Tobia: FL Studio ou Ableton?
MC FREITAS ZS: FL.
Tobia: Uma série do Disney Channel?
MC FREITAS ZS: Feiticeiros de Waverly Place… Pode falar mais? Pode falar mais?
Tobia: Pode, pode…
MC FREITAS ZS: Boa Sorte, Charlie, Jessie, Gravity Falls… muito bom, tenho até tatuado. Acho que só.
Tobia: Um lugar em Juquitiba?
MC FREITAS ZS: A feirinha. Ou pelas quadras de Juquitiba... Ó, presta atenção, essa track aí vai ser hit. “PELAS QUADRAS DE JUQUITIBA”.
Tobia: Roça ou cidade grande?
MC FREITAS ZS: Podia ser tipo assim: quatro dias na roça e três dias na cidade grande, né? Ficava aqui quatro dias na chácara da minha mãe e depois em São Paulo.
Tobia: E, para finalizar, fugir da roça para onde?
MC FREITAS ZS: Mais próximo da capital. Tipo assim, não muito perto, mas também não tão longe, tá ligado? Podia ser Itapecerica [da Serra], Cotia… Até Capão [Redondo], Capão eu ia topar mora lá. Capão é daora. Qualquer lugar próximo a uma estação, que não faça eu pegar dois ônibus para chegar, tá ligado? Eu fui colar no estúdio semana passada, eu tava no estúdio. Mano, fui, aí para voltar eu cheguei às 7h40 em Itapecerica. Eu cheguei em Juquitiba, era meio-dia, porque teve um deslizamento na BR, tá ligado? E não estava passando o ônibus. Eu dormi sentado no ponto, acordei, olhava, as mesmas pessoas lá ainda… Eu falei: "Mano, tá errado, velho".
Ao fim da entrevista, FREITAS mostra a visão que tem de sua janela: um límpido céu azul de um dia ensolarado, com mata por todo canto. Ao avistar as lindas colinas que se aglomeram no horizonte e a serenidade interiorana de Juquitiba, é fácil entender todo o carinho pela roça.