Crítica | RADIO LIBERTADORA


★★★★☆
4/5

Há três formas que pode-se começar a falar sobre o álbum, que chamam atenção logo de cara: a questão política, a diversidade sonora e estética, e pensar um histórico do funk e onde esse álbum está inserido a partir disso. Mas as três coisas acabam sendo a mesma, porque toda decisão desse novo lançamento de DJ K é uma decisão política e está inserida num lugar muito claro do funk, muito contemporâneo e extremamente importante.

Uma das coisas mais falsas e estúpidas que os críticos de funk ousaram dizer sobre o gênero é que as letras são simples, que falar sobre sexo explicitamente, do uso de drogas e de crime é estúpido e não serve para nada. Às vezes isso é bem esperado de um adulto conservador, o que é inesperado é ver o quanto esse discurso está presente na juventude de hoje — e sinceramente, uma juventude que se opõe ativamente a essas coisas é mais conservadora que os conservadores, eles são insuportáveis. Dito isso, DJ K vem levantando essas discussões desde o sucesso de PANICO NO SUBMUNDO. Até que ponto falar sobre isso é apologia ou política?

Bom, não entendi quando deixou de ser possível ser os dois. Me perdoem pela polêmica, mas na situação política em que vivemos, a apologia é uma das maiores armas políticas, e se sexo e libido não libertam, então não há salvação. No entanto, há, e é isso que DJ K está mostrando, não há separação possível entre as duas coisas. Uma música contra a ditadura pode sim usar o beat bruxaria e cantar letras sexuais explícitas — correção: deve! Não quero parecer muito "woke", mas existe algo mais antiditadura do que falar sobre sexo explícito? Sobre libido? E numa batida funk, que é pra lá de absurda, experimental, criativa e nada conservadora ou tradicional musicalmente?

Forma, conceito, linguagem, política… tudo isso está relacionado, e desse jeito o funk se relaciona entre o protesto, a política e a llibido. Fazer uma música de funk sem falar de sexo explícito até é possível, mas é infantil, hoje soam infantis as músicas do Claudinho e Buchecha, ou funks mais pop, como aqueles hits da Perlla. O que não quer dizer que são ruins, são excelentes, mas falta o discurso explícito para preencher o libido que a estrutura e a forma do instrumental do funk traz, os bailes sempre foram assim.

Para DJ K, é impossível não falar dos bailes, e é impossível também não falar sobre o histórico do funk. Ele usa disso muito bem nesse novo lançamento, além de uma ambientação perfeita em relação ao primeiro, o segundo está presente musicalmente, através de beats que vão da EDM, até o funk carioca dos anos 2000 e 2010. Desse jeito tudo se conecta, não é “trend”, é o gênero, é uma força política que se articula a partir desse modo de fazer música, que é acima de tudo, extremamente divertido, mutável e dinâmico.

O álbum novo do DJ K é a resposta que há mais de 25 anos se faz sobre esse gênero, e a resposta é que, não importa a geração, vai ser sempre o tipo de música no mundo inteiro mais impossível de censurar, de podar, de limitar. E foda-se a ditadura e os mini-ditadores da música que estão por aí.

Compre: Bandcamp
Selo: Independente
Formato: LP
Gênero: Funk / Beat bruxaria, Mandelão
Tiago Araujo

Graduando em História. Gosto de música, cinema, filosofia e tudo que está no meio. Sou editor da Aquele Tuim e faço parte das curadorias Experimental, Eletrônica, Funk e Jazz.

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