Os melhores discos africanos da década de 2020 (até agora)



Uma lista com Mdou Moctar, Duma, Asake, Pongo, Fulu Miziki, Obongjayar, Kampire e mais!

Pesquisar, desfrutar e entender a música produzida por artistas africanos não é uma das tarefas mais cotidianas do ouvinte ocidental. Seja pelo que se parametriza como música africana, que é um termo generalista demais e que não contempla nada em si, seja para encontrar discos que fogem do que a indústria fonográfica anglo-saxônica e europeia desejam que seja acessado. Porém, existe uma diversidade ímpar e inigualável entre os quase 60 países que compõem o continente africano, com tantas possibilidades de cair o queixo. Essa lista vêm de uma curadoria cuidadosa e que deseja priorizar, acima de tudo, o que há de mais transgressor e apaixonante nesse conjunto tão grande de artistas. Confira, portanto, os 25 melhores discos africanos lançados na década de 2020 até agora:



25. Yallah Beibe - MC Yallah



MC Yallah é uma força motriz do hip-hop ugandês, seja pelas suas rimas afiadas ou pela modelagem diferenciada de suas produções. Em Yallah Beibe, ela consegue transfigurar suas intenções para outros patamares.



24. Musow Danse - Les Amazones d'Afrique



Em Musow Danse, Les Amazones d’Afrique faz uma extensão das suas convenções mais indispensáveis. Continuando a espalhar a mensagem de fortalecimento mútuo e igualdade de gênero, o que vemos aqui são canções cheias de energia e gingado — que, indiretamente, antagonizam diretamente com a monocultura estéril da música pop ocidental.



23. Phelimuncasi: 2013-2019 - Phelimuncasi



Reunindo os elementos que consagraram Phelimuncasi no gqom sul-africano, Phelimuncasi: 2013-2019 se torna um disco de assinatura. São nove peças que documentam os sete anos iniciais do trio, dotadas de um vigor e criatividade ímpares que embalam as pistas de dança mais fervorosas que você já viu.



22. London Ko - Fatoumata Diawara



Seja pelas diversas parcerias ou pelas influências da música pop, é fato que London Ko é um trabalho diferenciado de Fatoumata Diawara. Uma das cantoras mais encantadoras do wassoulou, esse disco funciona justamente por entender de verdade as frentes com as quais ele lida — o que torna tão prazeroso de ouví-lo.




21. Slime Patrol - Khadija Al Hanafi




Em Slime Patrol, Khadija Al Hanafi faz do footwork e da cena de Chicago uma fonte para rearranjar suas próprias definições. Sua estreia é ancorada, principalmente, numa proposta menos eufórica, mas ainda muito dançante. Um demonstrativo em como gêneros ocidentais podem se beneficiar com artistas africanos os manipulando e injetando novos significados e visões.



20. MELTING - ABADIR



A indústria da nostalgia é um objeto potente de análise sobre os movimentos contemporâneos de cultura midiática — tanto com os seus produtos quanto a mentalidade reacionária que ela fomenta. MELTING propõe pontos de convergência fenomenais entre os mais de 500 fragmentos sonoros utilizados, justapostos e imbricados, que nos fazem pensar criticamente sobre esse passado romantizado que não existe. É uma escuta autofágica, em que o prazer está na sua própria ruptura.



19. Some Nights I Dream of Doors - Obongjayar



Ao estabelecer uma relação vindoura com o neo-soul, Obongjayar utiliza desse espaço para acrescentar elementos menos convencionais do momento atual do gênero. Some Nights I Dream of Doors é perfeito para madrugadas inquietantes, em que nossos sentidos parecem se dissolver numa sinestesia insalubre. Uma viagem solitária e, de certa forma, irresistível.



18. MetaConc - Onsy



Formando rasgos sintéticos e micropartículas sonoras, MetaConc ziguezagueia entre as barreiras do silêncio e a beleza do desconhecido. Onsy cria um universo particularmente desafiador, por incorporar diversos gêneros da música eletrônica sem abandonar sua base no ambiente, mas que é dotado de uma poética muito particular.



17. BUTU - KOKOKO!



Capturar a agitação explosiva do próprio espaço é o que move os artistas advindos das periferias de Quinxassa. Butu significa noite em Lingala, e KOKOKO! escolhe essa palavra para nomear um disco que é a propulsão maximalista e radical do grupo aplicada em entender os ambientes, os ruídos e as línguas que compõem a vida noturna da cidade francófona mais populosa do mundo.



16. Caravans of Ether - Hedon



É possível dizer que em Caravans of Ether existe um exercício de paisagem sonora, mas seria reducionista encará-lo apenas dessa forma. Com uma narrativa envelopada pelo mistério, em que acompanhamos uma caravana de peregrinos nômades ao longo do deserto do Marrocos, ficamos à mercê de uma experiência soturna e gélida. Atingindo nossos sentidos, seu principal valor está no não-palpável, onde as palavras não conseguem chegar.



15. Mr. Money With The Vibe - Asake



Em Mr. Money With The Vibe, Asake demonstra porque é um dos popstars nigerianos mais populares dos últimos anos. Com um conjunto de músicas extremamente envolventes, ele sabe aproveitar as melhores características do afro-fusion — seja pelas melodias cativantes ou por desdobramentos instrumentais diferenciados. É uma fonte garantida de diversão.



14. 6°30’33.372”N 3°22’0.66”E - Emeka Ogboh



As coordenadas do título do álbum faz jus à sua especificidade — em 6°30’33.372”N 3°22’0.66”E, as dinâmicas anárquicas de Ojuelegba simplesmente eclodem em si. Emeka Ogboh decide medir seus esforços em interseccionar o caos do tráfego urbano com todas as outras frentes geográficas, históricas e sociais que permeiam a região, através de capturas dos próprios sons e de entrevistas informais. E é na sua própria pluralidade que percebemos a minúcia de seus elementos.



13. Star Feminine Band - Star Feminine Band



Há certas sensações que apenas a juventude pode oferecer. Star Feminine Band é um grupo de meninas de Natitingou, no Benin, que segue o ímpeto de fazer música da forma mais genuína possível. Ouvir o disco homônimo delas nos dá a sensação constante de sermos abraçados, daqueles abraços cheios de ternura e doçura. É um acalanto ao coração.



12. Siti of Unguja (Romance Revolution on Zanzibar) - Siti Muharam



O romantismo aqui expresso ultrapassa as fronteiras do amor romântico; na verdade, isso é o que menos importa. A bisavó de Siti Muharam, chamada Siti Binti Saad, é a grande monarca do taarab, a música tradicional da costa suaíli. E é neste disco que a bisneta, chamada de “Golden Voice” do Zanzibar, se reencontra com a música da forma mais linda possível. Uma verdadeira carta de amor e um trabalho de legado, acima de todas as definições.



11. Mapambazuko - Titi Bakorta & Ale Hop



Ao se unir com Alejandra Cárdenas, musicista peruana com visões tão únicas, Titi Bakorta ressalta como a fusão entre música africana e música latina possui um histórico de peças transversais que provocam seus limites. Em Mapambazuko, é meio difícil detectar onde as guitarras de Bakorta começam e a psicodelia de Hop termina — elas estão entremeadas, enlaçando a cumbia e o soukous entre distorções alucinógenas, cantos de pássaros distorcidos e uma energia frenética que não cessa.



10. Sakidila - Pongo



Em Sakidila, Pongo desenha a sua trajetória, com um grande sentimento de gratidão, através do kuduro. Uma das artistas mais prolíficas e reconhecidas do gênero, é um demonstrativo que sua terra-mãe, a Angola, sempre será a base fundamental da sua música. É nessas relações que, também, potencializa o cenário musical fértil da diáspora africana em Portugal, em que ela está profundamente envolvida.



9. Afrique Victime - Mdou Moctar



Apesar de ser anteriormente conhecida como “uma banda de rock”, Mdou Moctar atua entre campos muito distintos — o uso das guitarras, que até parecem de outro mundo, também dividem espaço com instrumentos mais acústicos e com uma carga de temas altamente políticos. Em Afrique Victime, a banda faz o seu melhor trabalho até então em explorar esses caminhos, que são fundamentais para entendê-la e mensurar sua força por completo.



8. Swaken - Bab L’Bluz



A gênese de Swaken pode ser definida pelo orgulho originário e a retomada da cultura Amazigh. A banda franco-marroquina Bab L’Bluz desenha esses contornos de significados para além das convenções: é nos transportar para o vão entre duas dimensões, tão densas e tão fundamentais para a atualidade do povo marroquino. Uma transposição de ideias muito profunda e, de certa forma, urgente.



7. Buganda Royal Music Revival - Vários Artistas



Traçando uma perspectiva histórica, Buganda Royal Music Revival é uma peça transversal de resistência artística e antropológica. Revertendo a diluição da rica tradição musical de Buganda, esse disco se permeia, corpo a corpo, com gravações anteriores ao fim do reino (entre a década de 1940 e 1966) e registros recentes dos seus atuais musicistas, que se negam a ter essa parte da história de Uganda suprimida — e tudo isso se comunica pela beleza estonteante dos tambores, liras, xilofones e flautas.



6. Source of Denial - Nihiloxica



Se deixando levar pela costura de sons robustos, Nihiloxica sabe como agir com violência pelas vias menos tradicionais possíveis. É notável a forma que Source of Denial propõe criar multiversos agridoces que contemplam, ao mesmo tempo, o orgânico e o artificial, o áspero e o liso. Um trabalho exemplar sobre texturas, e ainda mais elucidativo em entender os desdobramentos da música eletrônica ugandesa.



5. N'Djila Wa Mudujimu - Lady Aicha & Pisko Crane's Original Fulu Miziki of Kinshasa



Em vias paralelas aos sons emergentes oriundos das periferias de Quinxassa, é muito interessante como uma filosofia anti-sistema e a efervescência criativa excêntrica também se desenvolvem. Com seus instrumentos feitos a partir de sucata e lixo descartável, Fulu Miziki desenvolve seu primeiro disco a partir do descompasso e da atmosfera atordoante das suas percussões. É de uma vivacidade que só poderia surgir dos lugares menos tradicionais possíveis — e é isso que o torna tão autêntico.



4. Kampire Presents: A Dancefloor in Ndola - Vários Artistas



A compilação de Kampire, uma das DJs mais efervescentes da cena musical de Uganda na última década, tem como grande fio condutor a sua infância — a relação com a música de Zâmbia, principalmente o soukous, resultou num projeto quase cartográfico dessa época. É um projeto que, acima de tudo, reforça como a afetividade com a sua formação afetiva é parte indissociável do DNA musical dos trabalhos de artistas africanos contemporâneos.



3. Temporary Stored II - Vários Artistas



A concepção-base de Temporary Stored é de um exercício de recuperação e reapropriação de arquivos sonoros que estavam enclausurados em museus ocidentais. Ao relançar com a colaboração de outros artistas, KMRU permite que este trabalho alcance novos significados — mais que uma extensão curatorial, é principalmente sobre a rebeldia e o entusiasmo em desmanchar fronteiras coloniais através de materialidades dispostas em diferentes perspectivas.



2. TE-KWARO ALANGO-EKUKA - Ekuka Morris Sirikiti



Para além das próprias convenções de memória, TE-KWARO ALANGO-EKUKA é um exercício de restituição. Concebido a partir de fragmentos, por muito tempo perdidos, de passagens do seu programa de rádio, Ekuka Morris Sirikiti, importante griô do povo Langi, brinca com a passagem do tempo e com a força da palavra. Um disco contemporâneo elementar — capaz de elucidar configurações culturais tão importantes do continente africano, mas, principalmente, de acessar o que é mais íntimo da experiência humana.



1. Duma - Duma



O que faz Duma se destacar, entre tantos na multidão, é a sua ambição. Ela carrega uma vitalidade difícil de se encontrar hoje em dia. Embebedada pela agressividade e bestialidade extremas dos gritos cáusticos, das instrumentações perfurantes e dos efeitos que derretem a nossa alma, é uma audácia grotesca que chacoalha até os mais fortes. É brutal e belo, pelos motivos mais disformes possíveis. É também um guia sonoro compacto, mas muito efetivo, de entender como a música experimental no continente africano age de acordo com as suas próprias definições.
Felipe

Graduando em Sistemas e Mídias Digitais, com enfoque em Audiovisual, e Estagiário de Imagem na Pinacoteca do Ceará. É editor adjunto do Aquele Tuim, integrando a curadoria de Música do Continente Africano.

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