Crítica | Divina Casca


★★★☆☆
3/5

Em menos de um ano, fomos levados diversas vezes a ambientes com uma ótica mais tropical e saleira. Caju, de Liniker, se entrelaça em romances intensos e profundos à beira-mar. Já Melly, por sua vez, mergulhava no Rio Vermelho com as fases do amor em Amaríssima. Porém, por mais que houvesse elementos solares – e, por vezes, regionais –, o espaço era preenchido por elementos que não seguiam necessariamente essa predominância. É nesse contexto que Rachel Reis se sobressai em Divina Casca, trazendo não apenas a parte mais rasa das águas nordestinas onde nasceu, mas carregando consigo o oceano de cultura (em sua forma mais bela) e tropical.

A marca mais relevante do disco é sua profundidade na estética praiana, constantemente presente — seja na musicalidade, que atravessa a MPB e alcança o regionalismo dos ritmos baianos, ou na ambientação texturizada das faixas, repleta de sons do mar e da natureza. É quase impossível não criar imagens mentais ao ouvir cada fragmento de “Ensolarada” e “Caju (Noda)”. No entanto, esse também é o maior desafio enfrentado por Rachel: ao longo do percurso, ela demonstra certa dificuldade em manter a atenção do ouvinte. Em alguns momentos, o LP se torna tão denso e repetitivo que nos sufoca — um afogamento sem escapatória, que nos obriga a interromper a escuta no meio do caminho. Com isso, muito do que foi cuidadosamente construído acaba se tornando imperceptível ao nosso ouvido (“Sal da Pele”).

As parcerias do álbum são bem costuradas — colocadas milimetricamente no lugar, como se fossem almas gêmeas encarnadas em palmeiras. Em destaque, Rincon Sapiência e Psirico engrandecem suas participações, puxando de suas bagagens passagens marcantes por gêneros como o reggae e o pagodão baiano. Rincon, por exemplo, carrega consigo um elo forte entre o pé na areia e a maresia leve e salgada — que remete aos antigos melôs — em “Tabuleiro”. Já Psirico evoca uma catarse carnavalesca: a sensação de dançar colado ao Farol da Barra, em frente ao trio elétrico, em “Apavoro”.

Divina Casca é um claro exemplo de autenticidade em meio a um cenário saturado por projetos que tentam evocar essa mesma energia mencionada anteriormente. A força do sotaque, entre melodias suaves, faz com que Rachel Reis emane paz e leveza — tudo sem sair dos pés da própria cama ou dos ouvidos de quem escuta com fones, como conchas que guardam o som de ondas quentes batendo nas pedras. O LP tem seus tropeços, , que pedem uma pausa antes que a magia retorne, mas, no geral, a obra é um grande passeio de canga, pé no chão e sem arrodeios. Vale a pena ouvir.

Selo: Altafonte
Formato: LP
Gênero: Pop / Música Brasileira
Lu Melo

Estudante de Jornalismo, 18 anos. Amante da música e da cultura pop desde a infância. Escreve para o Aquele Tuim, integrando a curadoria de R&B e Soul.

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